Uma padaria de Botafogo na história do rádio

Uma padaria de Botafogo na história do rádio

Essa história de café da manhã com pão francês não tem muito tempo, não. Até meados do século XIX, o pãozinho do brasileiro era o beiju ou tapioca, feito a partir da farinha de mandioca. A iguaria criada pelos índios alimentou os brasileiros por séculos.

Só para se ter uma ideia: o Rio de Janeiro, na época do Brasil Colônia, só possuía três padarias. O pão, geralmente à base de farinha de milho, era vendido por padeiros ambulantes, que carregavam cestos de pães de sal e doces por toda a cidade.

Foi somente no período da Belle Époque, entre o final do século XIX e o início do século XX, que as padarias e confeitarias vieram com tudo. A primeira, e até hoje uma das mais tradicionais confeitarias do Rio de Janeiro, foi a Casa Cavé, fundada em 1890, no Centro. Pouco tempo depois, em 1894, também no Centro, a Confeitaria Colombo abriu suas portas. Vem dessa época a história do pão francês, que de francês nunca teve nada. Era apenas um modismo de uma época em que tudo o que era de origem francesa era considerado chic pelos brasileiros – até as cortesãs!

As primeiras padarias de Botafogo só surgiram a partir da década de 1920. Até então, os moradores do bairro continuavam sendo atendidos pelos padeiros ambulantes. Em 1922, foi inaugurada a Padaria, Confeitaria e Armazém Bragança, na rua Voluntários da Pátria 318, esquina com a Real Grandeza. Foi sucesso imediato. A rosquinha amanteigada e o pão doce de coco, com raspas de coco e açúcar na cobertura e recheio de panetone, atraíam fregueses de todo lugar.

Um desses fregueses foi Ademar Casé, gênio da publicidade e responsável pela popularização do rádio. Certo dia, em 1932, ao passar de bonde pela esquina da padaria, Casé resolveu saltar para comprar pão. Gostou tanto do pão da Bragança, que resolveu convencer Seu Albino, dono do estabelecimento, a anunciar em seu programa de rádio – o famoso Programa Casé, primeiro programa de rádio comercial do Brasil.

– Um estabelecimento que faz um pão tão bom não pode deixar de anunciar no rádio.

O português olhava incrédulo para o freguês. Ó, pá! Onde já se viu uma padaria anunciar em rádio?

Casé insistia:

– O pão da Bragança está fazendo fama. Apesar de ser em Botafogo, já é conhecido em Copacabana.

Seu Albino estava irredutível. Mas Casé era vendedor e pagou para ver:

– Vamos fazer o seguinte: vou colocar o anúncio no ar. Se o senhor gostar, paga, senão fica de graça!

A criação ficou por conta de Antonio Nássara, compositor e ilustrador. Após ouvir o relato do encontro entre Casé e seu Albino, Nássara se inspirou na nacionalidade do cliente e compôs três quadrinhas em ritmo de fado, que foram ao ar na voz de Luiz Barbosa, imitando sotaque português e acompanhado por um coro. Este era o refrão:

“Oh, padeiro desta rua

tenha sempre na lembrança.

não me traga outro pão

que não seja o pão Bragança.”

Seu Albino ficou tão contente com a propaganda que fechou contrato de um ano com o Programa Casé.

No mesmo ano, foi inaugurada a Confeitaria Imperial, na Voluntários da Pátria 339, na esquina em frente à Bragança. Ostentando o lema “A quem serve, prudência; a quem é servido, paciência”, a Imperial era frequentada por políticos e celebridades. Tim Maia foi um desses frequentadores no tempo em que andava meio duro e morava de favor com o cantor e compositor Fábio, no número 171 da Real Grandeza. Tim Maia e o dono da Imperial se desentenderam um dia por causa da quantidade absurda de sonhos que o artista devorava, não deixando nenhum para os outros fregueses. Paulinho da Viola, cria do bairro, também frequentou a Imperial, assim como Baby do Brasil, Emílio Santiago e Lírio Mário da Costa, mais conhecido como o humorista Costinha.

A Bragança fechou as portas em 1978. Sua principal concorrente, a Imperial, também ameaçou encerrar as atividades em 2013, mas ganhou novos sócios e foi totalmente reformada. A Imperial, a Le Dépanneur, a Deli Delícia, a Panificação Voluntários e tantas outras oferecem diversidade, além do pãozinho nosso de cada dia. Mas a que entrou para história do rádio com um jingle tão charmoso foi a Bragança. Para sempre, na lembrança.

Antonio Augusto Brito