Já se curtia Botafogo no tempo das diligências
Chamar Botafogo de bairro de passagem, além de puro preconceito, nunca fez sentido. A verdade é que sempre foi um bairro acessível, aonde sempre se chegou facilmente, por terra ou por mar.
Botafogo entrou no mapa da cidade no início do século XIX, quando Dona Carlota Joaquina, esposa de Dom João VI, mandou construir para si uma casa na Praia de Botafogo. Seguindo o exemplo dela, mudaram-se do centro da cidade para o bairro outras famílias abastadas – nobres e ricos comerciantes, brasileiros e estrangeiros – em busca do clima agradável e do encanto de suas belezas naturais.
Assim, a Enseada de Botafogo, que não passava de ponto de pescadores, valorizou-se e não parou de se desenvolver. Em 1839, foi inaugurado um serviço de omnibus de tração animal. Com a construção do cais, em 1843, barcos a vapor passaram a apanhar e levar passageiros na Enseada de Botafogo. Vieram os tílburis (1847), as diligências (1850) e as gôndolas (1858).
A partir de 1870, com a crise da indústria cafeeira, o capital passou a buscar novas opções de investimentos. A abolição da escravatura e a chegada de imigrantes geraram uma crise habitacional. Investir no espaço urbano tornou-se um grande negócio.
Chácaras foram loteadas em toda a cidade, e Botafogo não fugiu à regra. Primeiro vieram algumas ruas; em seguida, foram criadas as travessas para ocupação do interior dos terrenos maiores. O bairro, que era nobre, começou a se povoar de habitações coletivas. Operários, biscateiros e artesãos ocuparam os cortiços. Já os militares, os profissionais liberais, os pequenos comerciantes e os bancários preferiram as casinhas de vilas.
O comércio se desenvolveu. Escolas particulares e públicas surgiram para os filhos dessa classe média incipiente. E vieram também os bondes, proporcionando transporte à população. O serviço, explorado pela Companhia Ferro-Carril do Jardim Botânico, atingiu seu apogeu entre os anos de 1920 e 1940. A garagem dos bondes ficava onde hoje é a Cobal, do Humaitá.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, bondes foram substituídos pelos lotações e, em seguida, pelos ônibus. Mais tarde, na década de 1980, veio o metrô, e as estações de Botafogo, do Catete e do Flamengo foram as primeiras da Zona Sul.
Um olhar mais atento encanta-se com Botafogo, que nunca abandonou suas características. Bairro acessível por vários meios de transporte, forte comércio, muitas escolas de qualidade, vilas e travessas, e, principalmente, população diversificada e sempre ávida por cultura.
A produção cultural sempre foi intensa no bairro: escolas de samba, teatros, cinemas, museus e inúmeros espaços culturais. Então, esse papo de “bairro de passagem” é pura inveja. Para chegar a Botafogo, nunca faltaram meios. Para ficar, não faltam motivos.