Prazer e negócios
Corto cabelo em um salão da rua Sorocaba. O barbeiro, que deve ter uns 30 anos, costuma se gabar de suas conquistas amorosas. Fico só ouvindo, lembrando que a rua Sorocaba tem esse nome em homenagem à baronesa consorte de Sorocaba, uma das muitas amantes do imperador dom Pedro I, aquele sim, um garanhão inveterado.
Diz a história – não aquela que a gente aprende na escola – que Pedro não podia ver um rabo de saia que já apresentava as armas. E, nesse particular, era democrático: deitava-se com criadas, meretrizes, artistas, mulheres de comerciantes ou damas da corte. Pouco importava.
O fogoso príncipe também não tinha pudores em manter relações com várias mulheres de uma mesma família, como fez com a dançarina Noemi Thierry e sua irmã. Em visita à casa de seu camareiro Pedro Cauper, acompanhado de Leopoldina, com quem era casado havia pouco, ele aproveitou para dar uma escapada com Noemi, enquanto as filhas de Cauper distraíam a princesa. Uma delas – Mariquita Cauper – também era amante do imperador. Leopoldina percebeu o esquema e queixou-se ao sogro, que despachou a família Cauper para Portugal. O marido de Noemi, militar, foi transferido para Pernambuco junto com a esposa, grávida de seis meses de Pedro.
Dom Pedro voltaria a se envolver com duas irmãs, as paulistas Domitila e Maria Benedita de Canto Mello. Domitila – mais tarde Marquesa de Santos – foi a mais famosa das amantes de Dom Pedro – e também a mais odiada – por confrontar a Imperatriz Leopoldina, estimada pela população, e ambicionar o trono. Já a irmã Maria Beneditina, bem mais pragmática e discreta, recebia Pedro I em sua casa, na Glória, quando este ia à missa, na igreja Nossa Senhora da Glória do Outeiro. Apesar da discrição, Domitila morria de ciúmes e, certa vez, encomendou o assassinato da irmã. Maria Benedita foi atacada a tiros quando passava em sua carruagem pela ladeira da Glória, mas escapou ilesa.
A intimidade das irmãs Domitila e Maria Benedita com o imperador rendeu benefícios econômicos e políticos para toda a família. Boaventura Delfim Pereira, barão de Sorocaba e esposo de Maria Benedita, foi o principal administrador dos bens de Pedro I. Domitila, tornada Marquesa dos Santos após a morte de Leopoldina, em 1826, receberia ainda a condecoração da Real Ordem de Santa Isabel de Portugal, além de conseguir títulos de nobreza para o resto da família. E os filhos do imperador gerados desses dois relacionamentos – Isabel Maria, duquesa de Goiás, e Maria Isabel II, condessa consorte de Iguaçu, filhas de Domitila; e Rodrigo Delfim Pereira, filho de Maria Benedita – foram os únicos filhos naturais de D. Pedro incluídos em seu testamento, embora não tivessem direitos sucessórios à Coroa. A rua Sorocaba foi aberta pelo conselheiro Antônio Delfim Simões, rico proprietário de terras em Botafogo e genro da baronesa de Sorocaba. A esposa do conselheiro, dona Mariana Simões da Silva, também foi homenageada, dando nome à rua paralela conhecida simplesmente como Dona Mariana, que atravesso sempre quando volto do barbeiro.