Do bar
O vaticínio do cineasta e pintor norte-americano Andy Warhol, no contexto internético, se expande e ganha ainda mais sentido, na medida em que o tempo por ele ali vaticinado – ‘No futuro, todos terão seus quinze minutos de fama’ – drasticamente diminui. Em outras palavras, alguns segundos na rede podem conferir a qualquer “idiota da aldeia” – para usar uma expressão do pensador italiano Umberto Eco – perene notoriedade.
No entanto, antes mesmo do fenômeno internético, as mídias existentes já davam espaço ao faz-tudo midiático, aquele a quem convencionou-se chamar multimídia. Jogando sempre nas onze, o multimídia faz teatro, faz televisão, faz cinema e, ainda por cima, escreve. E, às vezes, dança.
O outrora cineasta Arnaldo Jabor encaixa-se bem neste perfil. Oriundo do Cinema Novo, discípulo de Glauber Rocha, e depois de marcar o cinema nacional com pelo menos dois clássicos – Toda nudez será castigada, dos anos de 1970 e Eu te amo, dos anos 1980 –, Jabor, nos anos noventa, enveredaria para a imprensa televisiva, dali para a escrita – e, logo, a literatura.
Enfim, a fama. Deixando, portanto, a qualidade de lado, há mediocridades literárias que valem pela informação que trazem do tempo. Das crônicas de O malabarista destacam-se revelações preciosas acerca do nascimento daquele que foi o mais pretensioso movimento cinematográfico do país:
Tenho uma profunda saudade do bar da Líder (…) Que diabo é o bar da Líder? Lá na Rua Álvaro Ramos, em Botafogo, foi arquitetado o Cinema Novo. Era um botequim tímido, em frente ao Laboratório da Líder, onde revelávamos nossos primeiros filmes. (…) Hoje o bar virou uma ‘acrílica’ lanchonete.
Vale dizer que a gênese etílica do Cinema Novo é, incontestavelmente, dado histórico importante. O hoje cronista midiático, assim, ressalvadas as vicissitudes literárias, faz o registro do orgulho de ter tido um dia, num bar de Botafogo, o reconhecimento internacional de críticos do Cahiers du Cinéma, num tempo em que o meio era apenas uma super-8 na mão.
E, sendo o relato de Jabor fruto da memória, não deixa de conter sua dose do lirismo de uma época, estabelecendo a relação entre a novidade impactante do Cinema Novo e um específico boteco do bairro:
Daí nossa esperança naqueles anos utópicos, daí nosso desprezo por dinheiro, pela caretice e pelo sucesso burguês (…) Por isso o bar da Líder de noite parecia aquele barzinho do Van Gogh, jorrando luz, com estrelas enormes girando no céu de Botafogo.
Éramos assim em 1967.