Solidão no bar

Solidão no bar

Onde hoje é o Riso de Botafogo, na esquina de Voluntários com Paulo Barreto, no século passado havia um bar. 

Morador do bairro e, à época, estudante e bom biriteiro, parava ali com frequência, sobretudo nas noites em que vinha da UFF, em Niterói.

Numa dessas investidas etílicas, ao degustar mais um chope, foi quando olhei para o lado oposto do salão e o avistei: lá estava o escritor Antônio Torres – que também me olhava com olhos pidões.

Notando certa simpatia, na maior cara de pau, atravessei o salão e fui lá ter com ele. 

Àquela época, Torres já havia escrito Essa TerraUm cão uivando para a luaOs homens dos pés redondos e mais alguns tantos. No entanto, quando me aproximei, foi isso simplesmente que ele me disse, entre sorrisos – como se saído de uma solidão: 

– Caramba! Que bom, cara! Você me conhece! Já estou, acho, no 5º uísque e até agora ninguém falou comigo! 

E me convidou para sentar, e beber com ele, e papear. E eu dissera que o conhecia, sim, que o havia assistido em um evento na UFF, que havia lido Essa Terra, etc, etc. E logo via-se que o homem de fato retomara certa alegria.

O autógrafo que me foi dado num maço de Marlboro – à época ainda cultivávamos ambos esse hábito primitivo –, trago até hoje comigo.

E sempre gosto de pensar que, não fossem dias daqueles – ou mesmo aquele dia –, o velho Antônio Torres – e outros como ele – não estivesse hoje na Academia.

Lucio Valentim