Farofa mecânica
De acordo com a crítica especializada, a brutalidade é característica singular da prosa de Rubem Fonseca.
Sempre haverá um bando de putas, homicídios, necrofilias, estelionatos e delinquências de toda ordem em sua ficção.
Todo esse lado brutal e policialesco que brota dessa prosa se deve efetivamente ao fato de ter sido ele mesmo – o próprio José Rubem Fonseca – Comissário de Polícia, no Rio de janeiro, durante a longa noite de chumbo.
Por suas temáticas – e por sua linguagem –, os cinco contos de Feliz Ano Novo, best-seller que marcaria toda a escrita do autor, seriam sumariamente proibidos no ano de 1975, quando de seu lançamento.
Quatro anos depois da Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick, o nosso Zé Rubem exporia também a cara da nossa estúpida urbanidade:
“Pereba, vou ter que esperar o dia raiar e apanhar cachaça, galinha morta e farofa (…)”
No conto que dá título ao livro, são caras como Zequinha, Pereba, Lambreta e Tripé que vão protagonizar a gangue de delinquentes fortemente armados, que invade mansões da Zona Sul carioca numa noite de réveillon.
“Filhas da puta. As bebidas, as comidas, as joias, o dinheiro, tudo aquilo para eles era migalha. Tinham muito mais no banco.”
Depois de descerem o morro, fazerem “ligação direta” e rumarem do Santa Marta para as mansões do Leblon,
“Não vais comer uma bacana dessa? Perguntou Pereba.”
os meninos se divertem matando, estuprando e roubando:
“(…) o anel não saía. Fiquei puto e dei uma dentada, arrancando o dedo dela.”
E o aconchegante bairro de Botafogo, além de casa da gangue – o morro – ainda entra com a ruazinha deserta para a desova perfeita:
“Saímos. Entramos no Opala e voltamos pra casa. Disse para o Pereba, larga o rodante numa rua deserta de Botafogo (…) e volta.”