Rumo de Braga
Consta que Rubem Braga tinha um bosque em sua casa. Uma forma de resistência ao poder destrutivo da máquina e dos homens em relação à natureza etc. O fato é que a casa em que Rubem morava – e mantinha o tal bosque, com mangueira, goiabeira, jabuticabeira, araçá, pitangueira, passarinhos e tanques de peixes e coisa e tal – nada mais era que uma suntuosa cobertura no edifício da rua Barão da Torre, encravado bem no bairro de Ipanema.
Um dos maiores cronistas desta cidade viera de fora, digo, da vizinha e bucólica Juiz de Fora, para reproduzir em flora e prosa seu cotidiano de menino do interior num inusitado jardim suspenso – entre a favela do Cantagalo e a praça General Osório.
Diz que ali vivia como se estivera de fato no campo.
Mesmo sendo conhecido entre os amigos como o lavrador de Ipanema e a despeito do clássico de crônicas Ai de Ti, Copacabana, foi no bairro de Botafogo que se deu, em crônica, um dos momentos líricos mais impactantes desse fazendeiro do ar.
E era na era do bonde:
Eu ia no reboque, e o reboque tem vantagens e desvantagens. Vantagem é poder saltar ou subir de qualquer lado, e também a melhor ventilação. Desvantagem é o encosto reduzido. Além disso, os vossos joelhos podem tocar o corpo da pessoa que vai no banco da frente; e isso tanto pode ser doce vantagem,como triste desvantagem.
Qual surfista de bonde, saltando e subindo ao sabor do vento, o narrador de Braga pressente a chegada da nova estação, a partir de um sinal dado pela própria natureza, que tanto prezava: a folha seca.
O rumo de Braga, portanto, se constrói – uma vez mais – ao sabor da flora e da prosa:
Eu havia tomado o bonde (…) e quando entramos na Rua Marquês de Abrantes, rumo de Botafogo, o outono invadiu o reboque. Invadiu e bateu no lado esquerdo de minha cara sob a forma de uma folha seca. Atrás dessa folha veio um vento, e era o vento do Outono.
A praia era a de Botafogo. E o outono, o de 1935.