Garota de Botafogo
O maestro Tom Jobim e a modelo Helô Pinheiro – a “Garota de Ipanema” eternizada na música de Tom e Vinicius de Moraes –, quem diria, estudaram no mesmo colégio – o Instituto Juruena, na Praia de Botafogo.
Em 1944, Antonio Carlos Jobim cursava o último ano no Instituto Juruena, uma das escolas mais tradicionais de Botafogo na época. Ele e Marcos Konder Netto, amigo e vizinho, voltavam da escola de bonde até Ipanema, fazendo planos de estudar engenharia, até descobrirem que o queriam mesmo era arquitetura. Seis meses na faculdade, no entanto, bastaram para Tom Jobim decidir que queria ser músico. A futura musa da canção brasileira mais famosa nem era nascida – ela é de 1945 – e estudaria no colégio muitos anos mais tarde.
O Instituto Juruena funcionou, entre 1928 e 1968, no número 166 da Praia de Botafogo. Seu fundador, o cearense Arthur Juruena Gomes de Matos, era de origem muito humilde. Para estudar, precisou trabalhar de dia e frequentar as aulas noturnas na Associação de Empregados do Comércio. Colaborou com vários jornais, foi escrevente e comissário de polícia até fundar seu instituto e passar a dedicar a vida ao magistério. Arthur Juruena fazia questão de oferecer a melhor educação possível. Os intelectuais Antonio Houaiss, Celso Cunha, Evanildo Bechara e Geraldo França de Lima – que viriam a se tornar imortais da Academia Brasileira de Letras – estavam entre os professores do instituto.
Com isso, o colégio tornou-se uma opção de ensino laico de qualidade. Além de Tom Jobim e Helô Pinheiro, estudaram lá os atores Jardel Filho e Maria Fernanda, filha de Cecília Meireles; o campeão de salto em distância Adhemar Ferreira da Silva; o músico Guilherme Dias Gomes, filho dos dramaturgos Dias Gomes e Janete Clair; o gravador e pintor Rossini Perez e o cantor e compositor Geraldo Vandré.
O paraibano Vandré chegou ao Rio em 1952, com 17 anos. Após uma rápida passagem pelo Colégio Anglo-Americano, foi estudar no Instituto Juruena. A partir da amizade e da parceria com o jovem músico Carlos Lyra, morador de Botafogo, Vandré começou a compor alguns dos primeiros sucessos como Quem quiser encontrar o amor e Aruanda.
As coincidências entre os músicos Tom Jobim e Geraldo Vandré iriam muito além dos muros do Juruena. Ambos fizeram parte do movimento Bossa Nova e, no início de suas carreiras, se apresentaram na boate Tudo Azul, de Copacabana. Enquanto Tom já era pianista profissional, Vandré e outro cantor desconhecido, um tal de João Gilberto, tentavam aparecer no intervalo de shows de gente mais famosa como o cantor Ed Wilson, fundador da banda Renato e seus Blue Caps. Disputariam ainda a final do Festival Internacional da Canção de 1968 – Vandré com Pra não dizer que não falei de flores (Caminhando) e Jobim com Sabiá*. Naquele tempo, Tom e Vinicius de Moraes já haviam composto Garota de Ipanema, que bem poderia ter sido Garota de Botafogo, tivesse Vinicius permanecido no bairro de sua infância.